segunda-feira, 5 de novembro de 2012



GRANTA 10

"O décimo volume de Granta em português traz 14 textos inéditos no Brasil que remetem a situações-limite. Mesclando nomes nacionais e internacionais já consagrados e outros promissores, a edição reúne contos, ensaios, relatos e cartas que abordam o extremo da loucura, da doença e do sexo, ou ainda que narram momentos, sem precedentes, de crise. São histórias sobre envolvimento com drogas, mazelas de guerras, perda da memória e, em caso extremo, a própria morte.

Will Self abre a edição de Granta: medidas extremas com um relato de cunho autobiográfico sobre uma crise aguda em sua vida. De língua inglesa, está também presente uma heterogênea seleção de escritores norte-americanos, entre eles Stephen King, Don DeLillo, A. M. Homes e Phil Klay, além da inglesa Jeanette Winterson e da canadense Alice Munro.
O volume inclui um ensaio de Roberto Bolaño e um conto de Evelio Rosero, considerado um dos grandes escritores colombianos da geração pós-García Marquez. Há ainda uma compilação de cartas de António Lobo Antunes destinadas a sua mulher, então grávida, durante a guerra em Angola. De autores brasileiros, há textos de Beatriz Bracher, Andréa del Fuego, Adriana Lisboa e Everardo Norões. A revista dispõe ainda do ensaio em cores com 13 fotos das esculturas do artista plástico mineiro Matheus Rocha Pitta, que prepara atualmente uma exposição para a Fondazione Volume!, em Roma.
Já publicado na edição inglesa de Granta sobre terror, Will Self, um dos finalistas do Booker Prize, escreve o relato “Sangue falso” em primeira pessoa. Nele, o escritor detalha o diagnóstico de Policitemia vera recebido durante a virada de 2010 para 2011. A estranha enfermidade gera o súbito aumento de glóbulos vermelhos no sangue, tornando-o mais grosso. Com franqueza desconcertante, o autor de Grandes símios rememora o abuso de drogas durante sua juventude, sem, no entanto, buscar justificativas para seus atos nem expiar qualquer culpa do passado.
Bem antes de tornar-se um dos mais célebres escritores de língua portuguesa, António Lobo Antunes participou do conflito colonial de Angola como médico do exército português entre 1970 e 1973. Durante o período, ele trocou uma série de cartas com sua então mulher, dentre as quais 12 foram selecionadas para essa edição. A correspondência flagra o autor em momentos de intimidade, discorrendo sobre o amor, a medicina, a literatura e a guerra. As mensagens fazem parte do livro D’este viver aqui neste papel descripto, organizado por suas filhas e publicado em Portugal em 2005.
Cultuado como o maior expoente da literatura latino-americana contemporânea, Roberto Bolaño tem o ensaio “Literatura + doença = doença”, extraído do livro El gaucho insufrible, publicado nessa edição. Em tom áspero, o chileno fala sobre o ato de escrever, a doença e a morte: “Escrever sobre a doença, principalmente se você estiver gravemente doente, pode ser um suplício. Escrever sobre a doença se você, além de estar gravemente doente, é hipocondríaco, é um ato de masoquismo ou de desespero. Mas também pode ser um ato libertador. Exercer, durante alguns minutos, a tirania da doença (...) é uma tentação, uma tentação diabólica, mas ainda uma tentação.”
Entre os brasileiros, a escritora Beatriz Bracher escreve um conto mimetizando um diário de uma mulher que viaja em busca de seu irmão a uma região de garimpo no Pará. Adriana Lisboa, que lançará romance pela Alfaguara em 2013, transita em “Aquele ano em Rishikesh” pela fronteira entre ilusão e realidade ao abordar o Alzheimer de uma idosa em meio a pensamentos confusos e desconexos com algum fundo de verdade.
Em “Sofia, o motorista e o cobrador”, Andréa del Fuego dá vida a um cobrador de ônibus quarentão e sem olfato que cria uma obsessão por Sofia, uma das passageiras. Fechando o time de escritores nacionais, o poeta cearense Everardo Norões, já traduzido para diversos idiomas, tem o conto “Na varanda, sobre o bulevar”, extraído de seu primeiro livro dedicado ao gênero, incluído nessa edição. O texto de tom onírico é forjado entre o exotismo de uma cultura estrangeira e repressora e de sensualidade latente. "

sábado, 27 de outubro de 2012






Aqui jaz a biblioteca de Álvaro Lins

Quando todo mundo alardeia a chegada do anjo do progresso, uma velha biblioteca incomoda: a do escritor Álvaro Lins. Há anos ela vive relegada às prateleiras do atraso, na cidade onde nasceu há cem anos, Caruaru. Uma biblioteca que acabou por se transformar na metáfora de seu próprio dono. De fato, poucos intelectuais brasileiros pagaram tão caro por dizer tudo e por não temer confrontos quando a palavra destoava dos acontecimentos. Tanto na escrita, quanto na diplomacia, ele foi assim. Severo no avaliar escritores consagrados, Álvaro Lins não hesitou a atitudes como a de entregar o cargo de embaixador em Portugal, naquela hora em que os compromissos do governo brasileiro com a ditadura salazarista passaram a ferir suas convicções. O mesmo faria, anos depois, o escritor Octavio Paz, ao renunciar ao posto de embaixador na Índia, após o episódio conhecido como o massacre da Praça Tlatelolco. Não tivessem deixado uma obra importante os dois certamente teriam sido relegados pelos registros oficiais, ‘enterrados’ como a biblioteca de Álvaro Lins.
Acontece que os objetos às vezes dizem melhor do que a fala de seus próprios donos. Pois a leitura da História nem sempre é feita pelos livros, que costumam deformar e mistificar gente e acontecimentos. Objetos podem desvelar a realidade, como as substâncias químicas revelam fotografias. Ou como a arqueologia, que precisa cavar fundo, esmiuçar detritos, pedregulhos, para encontrar a flecha, o cadáver, o simulacro.
Que conversas, anotações mantêm entre suas páginas aqueles livros do escritor de Os mortos de sobrecasaca? Que comentários sobre o que seguia pelo Mundo? Que rabiscos sobre frases destoantes de algum escritor em busca da glória literária? Quem dentre os pares teria infringido promessas, colaborado com descalabros, foram ali observados pelo cru e implacável registro de um dos críticos literários mais importantes da América Latina?
Não existe acaso para o esquecimento. Nossa história é como álbum, para o qual recolhemos as figuras que iremos colar para suprir a memória, quando esta não mais responder ao chamado do afeto.
Uma biblioteca diz muita coisa; por isso, às vezes, precisa ser torturada, destruída, esquecida. Seus livros podem ser sequestrados, entregues ao mofo, ao descaso. Depois, deve ser transportada de lugar a lugar, como subversivo, para o qual nunca existirá ‘comissão da verdade’. Apenas ficará à espera de alguém que, finalmente, venha colar à porta do último sótão, a placa com o dizer como este: “Aqui jaz a biblioteca de Álvaro Lins”.

quarta-feira, 12 de setembro de 2012



O escritor como operário


Roberto Arlt

Se você conhecesse os meandros da literatura se daria conta que o escritor é um senhor que tem por ofício escrever, como outro tem o de fabricar casas. Nada mais. O que o diferencia do fabricante de casas é que os livros não são tão úteis quanto as casas, e depois... Depois, que o fabricante de casas não é tão vaidoso quanto o escritor.

Nos dias atuais, o escritor acredita que ele é o centro do mundo. Enrola como bem quer. Engana a opinião pública, consciente ou inconscientemente. Não revisa suas opiniões. Acredita que o que escreve é verdade simplesmente por ter sido escrito por ele. Ele é o centro do mundo. Quem tem dificuldades até em escrever à família, pensa que a mentalidade do escritor é superior à de seus semelhantes e está equivocado em relação aos livros e aos autores. Todos nós, os que escrevemos e assinamos, o fazemos para ganhar a bóia. Nada mais. E para ganharmos a bóia não hesitamos, às vezes, em dizer que o preto é branco ou vice-versa. E, além disso, ás vezes nos permitimos o cinismo de rir e de acreditar que somos gênios.



(de Aguasfuertes porteñas)

quarta-feira, 6 de junho de 2012





OS COLARES E AS CONTAS
POEMAS POLÍTICOS
MARCELO MÁRIO DE MELO

DIA 20 DE JUNHO DE 2012, DE 19 ÀS 22h
 MUSEU DO ESTADO DE PERNAMBUCO
AV. RUI BARBOSA, 960 - GRAÇAS RECIFE-PE
FONE (081) 427-9322

"Entre o iconoclasta e o satírico,
a forma erudita e popular, 
o concerto de lucidez da escrita de Marcelo Mário de Melo 
serve-se sempre desse abrir-se em par 
para desembocar na po-ética, o difícil cruzamento 
entre ética e poesia".  

(Everardo Norões)

segunda-feira, 4 de junho de 2012





Memória dos porcos

Regresso dos Cariris e encontro sobre a mesa o último livro de Ronaldo Costa Fernandes, memória dos porcos (7Letras. Rio de Janeiro) . Acompanho de perto a produção desse poeta, na minha compreensão um dos melhores do país. Não fosse a tirania das grandes mídias e o recolhimento dos que escrevem pelo religioso prazer da escrita, ele seria bem mais conhecido. Mas a boa poesia é como erva daninha, teimosa em brotar de novo, mesmo quando submetida à fúria dos herbicidas.

Varal dos sonhos

Ronaldo Costa Fernandes

Depois da chuvarada,
os passarinho vieram quarar as asas
no varal do fio de alta tensão.
Ali ficaram pendurados
como roupas de asas,
sob o sol morno da vida.

Os morcegos, ao contrário,
se penduram no trapézio
do forro e dormem invertidos
como minha alma ao forro do dia.

À noite, acordados,
vêm voar nas vigas dos meus pesadelos
e transformar o que é forro
em fio de alta tensão.

sábado, 5 de maio de 2012


Transcrevemos a opinião do escritor, poeta e crítico do Rio Grande do Sul, Romar Beling, a propósito do novo livro de Majela Colares, Memória líquida:



Romar Beling

O final de abril foi marcado pela chegada às livrarias do mais recente livro de poemas do cearense Majela Collares (foto abaixo), de quem já se tratou em mais de uma ocasião no acervo do Leituras de Mundo. Memória líquida foi lançado em São Paulo no dia 25, com a presença do autor, sob o selo da Editora Confraria do Vento, do Rio, e agora passa a circular em todo o País e a estar disponível ao olhar dos leitores.
Natural de Limoeiro do Norte, terra que também já apresentou o poeta Luciano Maia, o cantor do Jaguaribe, à literatura brasileira, Majela é suficientemente reconhecido junto a críticos e leitores de larga envergadura. Para ter-se uma ideia, Kurt Meyer-Clason, o respeitado tradutor que versou Grande sertão: veredas para a língua de Goethe, assinou igualmente uma coletânea de poemas de Majela traduzidos para o alemão, o volume O silêncio no aquário / Die Stille im Aquárium. Nascido em 1964, Majela está desde 1992 radicado no Recife, onde forma, ao lado de, dentre outros, Everardo Norões, ilustre filho do Crato, e de Ronaldo Correia de Brito, este de Saboeiro, um respeitável grupo de escritores e intelectuais cearenses e nordestinos. É de lá que vem, e cada vez mais virá, a autêntica renovação formidável da literatura brasileira, com um acento universal indiscutível, apoiado sobre o local e o coloquial, o pitoresco e o cotidiano, do sertão acariciado pelas brisas do litoral.
No caso específico de Majela, ensaístas de renome, como Marco Lucchesi, Hildeberto Barbosa Filho, Ivan Junqueira, Fernando Py, Ana Miranda, Alexei Bueno, André Seffrin, Francisco Carvalho, Fábio Lucas, o próprio Everardo Norões, Dimas Macedo, Curt Meyer-Clason, dentre outros, já se ocuparam de sua poesia. A esse conjunto de apreciações agora tende a ser agregado o impacto imagético e de conteúdo de Memória líquida (da linda capa acima), título que, aliás, tão oportuna e vitalmente remete ao conjunto temático de seu conterrâneo Luciano Maia, cujo Jaguaribe, memória das águas é digno de ser posicionado em todas as bibliografias.
Na orelha desse novo livro, Ana Miranda, por sinal, menciona: “Ler Memória líquida é uma experiência de beber as palavras na sua pureza mais cristalina. (...) Memórias que constatam a dolorosa consciência e, acima de tudo, a ameaçadora presença humana neste astro impreciso... Memórias que são também balidos e ritmos perfeitos, cantadas na voz de um poeta elevado...”. É Majela Collares firmando seu nome em nosso imaginário.

Postado por Romar Rudolfo Beling - romarbeling@yahoo.com.br
http://www.gaz.com.br/blogs/leiturasdemundo/posts/11677-memoria_liquida.html

sábado, 21 de abril de 2012

Ao vencedor, as batatas

1948.  A um dos livros mais conhecidos de Pernambuco, O tempo dos flamengos, do escritor e historiador José Antonio Gonçalves, é recusado o prêmio Othon Bezerra de Melo. A Academia Pernambucana de Letras – a quem cabia a escolha – prefere eleger a coletânea de versos de Oscar Brandão, um dos seus. Mauro Mota rebela-se. Publica no Diario, no dia 22 de agosto, a crônica Ao vencedor, as batatas. Um livro de “sonetos e cantatas de aceitação apenas doméstica”, escreve, suplanta um ensaio histórico que se tornaria clássico da historiografia brasileira. Mauro Mota esbraveja. Escreve que a literatura “nada tem a ver com as loas vergonhosamente conduzidas aos cornos da lua e que nada mais valem do que algumas moedas de dez tostões fabricadas em Tejipió”. A crônica consta do livro O suplemento e Mauro Mota, organizado pelo jornalista Jodeval Duarte, editado pela Comunigraf, em 2001, ano em que o poeta faria 90 anos.

Obs. Ilustração pintura de Botero

domingo, 25 de março de 2012


Cristo dentro do Tribunal de Justiça



Numa das salas de julgamento do Tribunal de Justiça de Pernambuco, cujo edifício nestes dias completa 180 anos de construção, um enorme crucifixo pende da parede. Acima dele há uma estátua da Justiça, cega, espada na mão. Nossa Constituição prega a igualdade de direitos, entre eles o de crença. E como no país não há apenas católicos, mas também muçulmanos, protestantes, judeus e pessoas de tantas outras religiões, aquela cena parece bem pouco católica.
Há de se pensar como se sente um brasileiro que professa a doutrina do Islã, quando, num órgão público, é confrontado a manifestações de uma fé que não é a sua. Ou um rabino, que por alguma razão seja levado a visitar recinto como aquele do Tribunal. Seria mais confortável se a estátua da Justiça estivesse sozinha naquela sala, com a venda nos olhos e a espada na mão, lembrando a via da imparcialidade de Salomão.
Quanto ao Cristo, para ser lembrado por aqueles que acreditam no Deus feito homem, não precisaria estar ali reproduzido em estátua. Bastaria que dentro de cada um Ele assumisse a dimensão daquele Menino Deus do poema de Fernando Pessoa, mais precisamente de seu heterônimo, Alberto Caeiro, que conta um sonho em que Jesus Cristo desce à terra tornado menino, deixando no céu um Cristo eternamente na cruz. O Poeta diz que aquela criança lhe ensinara a  atirar pedras, a roubar frutos e a ver flores. Uma criança “tão humana que é divina”, com a qual goza o segredo comum que é “o de saber por toda a parte que não há mistério no mundo e que tudo vale a pena”.
Essa Criança Nova do Poeta não carece de imagem, mesmo porque algumas representações acabam por lembrar um catolicismo de outros tempos, que deitou raízes num passado colonial de visitadores do Santo Ofício, iluminado pelas fogueiras da Inquisição, nas quais eram queimados judeus, muçulmanos e todos aqueles que não concordavam com o pensar oficial do Império português. Um catolicismo que, infelizmente, acabou entrando República adentro para se identificar com o lado mais conservador de nossa ‘elite’ nacional.
A manutenção daquela estátua no Tribunal certamente foi um ‘esquecimento’ de alguém que não observou a mudança na Constituição, nem atentou para brasileiros de outros credos. Da mesma forma que, ao lado de nossa Rua do Imperador encontra-se a Praça da República. Porque nossa memória cidadã está sempre a sofrer de arteriosclerose.
Na França, onde a república custou tanto sangue para ser instaurada, não se ouve falar de rua ou avenida com o nome de Luís XVI...

(Essa matéria é parte de um artigo publicado na Gazeta Mercantil, em 20.08.2002. Recentemente, mais de dez anos depois dessa publicação, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul aboliu a exposição de imagens de caráter religioso nas suas dependências).
Obs. A ilustração é o Cristo de Grunewald.

sexta-feira, 23 de março de 2012



wb na política

que partido
lhe franquearia a ficha de inscrição
nunca seria o anão enfurnado
na jaula dos espelhos
a manipular no jogo de xadrez
a alquimia da trapaça
a imagem autêntica do passado
é um raio, diz,
e a verdade imóvel não traduz
a matéria da história
daí o quarto de uma só janela
os dias corroídos pelo sal de ibiza
a fuga pelas escarpas dos pirineus 
a tempestade a afugentar os anjos
e a lançar seus escombros
sobre a caligrafia do último justo

quinta-feira, 8 de março de 2012




A tatuagem escreve e circunscreve o corpo. Esconde e, ao mesmo tempo, desnuda. Escorpião ou colibri, estrela ou dragão a cuspir chamas, os traços investem em colorido sobre a epiderme, delimitam um território. O desejo de anunciar o diferente anula-se na reprodução de signos que nada mais dizem.  O gesto que tem por desejo reduzir o anônimo, anuncia o banal. A reprodução técnica carimba o coletivo e o transforma em gado. O corpo, em vez de praça para expressão de alguma estética ou símbolo, metamorfoseia-se em fetiche, tal o código de barras da mercadoria na vitrine.
O olho perdeu o hábito da paisagem, foi rendido aos sinais. A velocidade da vida não permite que ele transgrida, demore-se, alongue o horizonte que deixa vislumbrar o mistério. Rapidez e clareza são as características das marcas feitas para anunciarem perfumes, automóveis, partidos políticos, gente. A massificação da moda após a disseminação do prêt-à-porter relegou a originalidade aos desfiles de modas apresentadas na televisão por modelos andróginos, onde há mais de baile de fantasia do que protótipos de vestimentas: roupas mostram-se, mas não vestem.
Diluído na multidão, sem nada que o diferencie da onda humana que cada dia mais toma conta dos espaços públicos, vestida com camisetas berrantes repletas de frases em inglês, ou com marcas que sugerem algum luxo, resta ao indivíduo recorrer ao tatoo. E, assim, fazer o contrário da tradição indígena que tinha no corpo – a exemplo dos cadiuéus – o lastro anunciador de uma estética cujos significados transcendiam o vulgar.

quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012


Quase todos os dias passo pela praça que tem o nome do poeta Faria Neves (1872 -1927). É dele o poema O rio. Pela temática, pode nos lembrar Heráclito ou o Pont Mirabeau, de Apollinaire. A praça foi projetada por Burle Marx, na década de 30, período importante da arquitetura modernista no Recife, que contou, além dele, Burle Marx, com nomes como Mário Nunes e Joaquim Cardozo

 O RIO

 Faria Neves

É sempre o mesmo leito pedregoso
e, sobre o mesmo leito, o mesmo rio,
a soluçar queixoso
o mesmo murmúrio...

Tão só, no eterno marulhar das mágoas,
não são mesmas as águas...

E eu penso em mim, nas ilusões fanadas,
sempre desfeitas, sempre renovadas...

E comparo-me ao rio, tristemente...
E comparo-as às águas da corrente.