segunda-feira, 21 de junho de 2010




Traduzi este belo e importante texto de Paul Louis Rossi, amigo e poeta francês, de quem traduzi alguns poemas para a antologia Regards transatlantiques. O trecho faz parte do livro Paysage intérieur, inscapes, editado em 2004 pela Prefeitura de Nantes, numa série de homenagens feitas ao autor, em 2004.

Inscapes

Paul Louis Rossi

Traduz-se inscape, em francês, por Paysage intérieur (Paisagem interior). Essa interpretação é satisfatória, mas não revela a complexidade da noção d’inscape, elaborada por Gerard Manley Hopkins, poeta de língua inglesa.
Embora ele seja pouco traduzido, e quase desconhecido na França, considero Hopkins um dos maiores poetas da lírica contemporânea. Nasceu em 28 de julho de 1844, em Stratford, Inglaterra. Jovem, frequentou a Grammar School de Sir Robert Chomondesley, em Highgate, onde residiram Coleridge, De Quincey e Keats.
Em 1866, Hopkins abandona a religião anglicana e se converte ao catolicismo. Na Inglaterra vitoriana, essa conversão equivalia a um suicídio social. É renegado pelos amigos, e até mesmo pela família. Ingressa nos Jesuítas, em Roehampton, em 1868, no País de Gales. E queima seus poemas de juventude.
Em 1872, na ilha de Man, descobre Duns Scot. Este, que é chamado o Doutor Sutil – teólogo da escola franciscana, no século XIII, que polemizou com a doutrina de Tomás de Aquino – vai reconciliar Hopkins consigo mesmo, com o mundo sensível, a arte, a poesia.
O teólogo escossês pensava que a divindade se encontrava em cada elemento do universo, as plantas, as rochas, as nuvens, como na religião dos celtas. Scot escrevia: “a revelação tem um papel prático no universo; ela preenche a razão onde ela não pode chegar”.
A partir dessa filosofia de Duns Scot, Hopkins construiu a noção de Instress, que pode ser explicado como:
Golpe desferido no observador pela força intrínseca em todo objeto que lhe dá força e vida...
Ele toma como exemplo a nuvem para explicar essa noção:
A forma de uma nuvem é modelada: instressed pelo vento...
Para apreender essa noção de inscape, é preciso reter essa imagem da nuvem que se compõe e se descompõe ao sopro do vento. Ele anota no seu diário:
Esta manhã, inscape de nuvens...
É necessário admitir que essa imagem da nuvem, inscrita na visão é, no entanto, fugitiva. O inscape não se perpetua, surge através de um sujeito que observa o mundo e que é susceptível de reconhecê-lo na sua integridade, sua originalidade e sua beleza. Mas ele desaparece à menor brisa.
A própria palavra inscape é um neologismo forjado por Hopkins a partir de landscape. Portanto, paisagem interior, mas, ainda, motivo íntimo, esquema do intrínseco:
O instante apreendido na sua própria forma...
Como John Ruskin e William Turner, Hopkins exprime uma noção totalmente moderna da estrutura totalizante de uma paisagem, da forma de uma nuvem, de cada onda que se espraia.
Gerard Manley Hopkins morre em 8 de junho de 1889 na seu retiro de Tullaberg. Está enterrado no Jesuit Plot de Glanevin, na Irlanda. Ele era obcecado pela miséria material e moral do povo. Ele escreveu a Robert Bridges, em 1871:
No entanto, temo que estejamos às vésperas de alguma grande revolução. É terrível dizer, mas, num certo sentido, sou comunista...
Essas idas e vindas na existência e o laboratório do escritor inglês nos permite escolher o título de Paysage intérieur (Paisagem interior)inscape – com a intenção de criar para os visitantes uma evasão, uma visão, um universo mental, uma perspectiva onde eles possam se reconhecer.
Desejo que cada um dos visitantes retenha o que convém a seu espírito e ao seu gosto. A literatura é como a onda, ou a nuvem, que passam. Cada onda apaga um pouco o rastro da precedente, idêntica e diferente, portanto. Cada nuvem traz ao céu sua própria cor. É desejável que cada visitante imagine e leia nesse movimento a realidade e a forma de seu desejo.

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