quarta-feira, 10 de agosto de 2011



Outubro, 2008

Leio jornais
e sinto o roçar da barba de Marx
em nossa pele.
Não o Marx de papel cromo:
o dos furúnculos que se multiplicam
como crianças trituradas
nos teares de Manchester.
Leio os jornais
e faz calor nos trópicos,
mais do que de costume,
nesses cem anos de Lévy-Strauss.
Ei-lo
a decompor as equações da mais-valia,
enquanto fios de barba enroscam-se
nos chips que medem a pulsação do sexo
nos corredores de Wall Street.
Seja bem-vindo, velho Marx!
Mesmo com a mancha de café na gola da camisa,
contas a pagar no bolso esquerdo do casaco,
cabeça a mil nos esquemas da reprodução ampliada.
Leio os jornais
e sinto tua barba a incomodar de novo
jovens estagiários de terno e gravata,
especuladores que acompanham as cotações da Bolsa,
empresários que apostam nas próximas estações...
Aqui estarás a salvo em alguma favela,
conversarás com personagens de subúrbio,
olharás ao longe o Cristo que abre os braços,
como quem diz:
Fiz o que pude!
Depois, voltarás para casa,
reformulando velhas ideias sobre
o lumpenproletariat,
mesmo sem saber se irás torcer
pelo Vasco ou pelo Flamengo...

(Poeiras na réstia. 7Letras. Rio de Janeiro. 2010)

Um comentário:

Fred Machado disse...

Estava com saudades, caro amigo, de suas palavras. Acho que nessa semana, de tanta luta vã, todos estamos sentindo.