terça-feira, 17 de janeiro de 2012



Só agora, passada a ocasião em que todo o mundo se sente obrigado a falar do morto, escrevo sobre Luis Carlos Monteiro. Uma semana antes de seu passamento – termo mais simpático, que aprendi nos velórios de antigamente – fez-me uma visita. Ficamos quase uma tarde a conversar. Havia trazido meu exemplar da antologia de crônicas, que ele organizara para o Instituto Maximiano Campos, e prometera entregar-me em mão. Foi o bom pretexto para o encontro, o último. Falou de literatura com o respeito do artesão que ama o ofício,  aquele seu jeito modesto e simpático de operário das letras. Nos textos de seu blog, para o qual escrevia suas resenhas críticas de forma sistemática, percebia-se o quanto lia e acompanhava o universo dos livros. E mesmo quando seus escritos padeciam eventualmente de alguma observação discutível, ou eram merecedores de algum reparo, sentia-se que eram movidos por uma força maior que os salvava: a paixão pela literatura. Não parecia bem, naquela tarde, Luís Carlos. Via-se que um mal qualquer lhe tocara. Mas ninguém pressentia que Ela chegaria tão depressa. Saiu alegre da visita, com a promessa de uma nova conversa, deixando no ar seu Mundo circundante, que poderemos reler com saudade até quado a internet o mantiver, e no qual postou, nos seus últimos dias, à guisa de testamento ou de pressentimento, este poema de Micheliny Verunschk:

História
 Micheliny Verunschk

Desenterrar os mortos
e chupar seus ossos,
sugar seu mosto
de terra e sangue seco,
seu gosto secreto
de anos infindáveis,
arcos,
costelas,
arquitetura.

Se infeccionar com os mortos.
Triturar seus artelhos
de esponja ressequida,
pintar de negro e noite
de dentes e saliva
e abandonar o sonho
viva, muito viva. 

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